Evento reúne mais de 5 mil participantes para discutir direitos, ameaças ambientais e proteção cultural
Após mais de 32 horas de viagem de ônibus desde São Félix do Xingu (PA), a anciã Pangroti Kayapó, de 60 anos, e sua neta Nhaikapep, de 22, chegaram a Brasília para participar da 1ª Conferência Nacional das Mulheres Indígenas, que começou na noite de segunda-feira (4). Para elas, o evento é mais que um encontro: é um espaço de denúncia e resistência.
As duas fazem parte do povo Kayapó e vieram para alertar sobre as consequências do garimpo ilegal em sua região. Segundo Nhaikapep, que atua como tradutora da avó, os rios Fresco, Iriri e Xingu — que cortam o território da comunidade — estão contaminados por metais pesados. “Mesmo com o território demarcado, nos sentimos ameaçadas”, afirma.
Pangroti, que só se comunica no idioma originário, resumiu o sentimento das mulheres indígenas:
“Para proteger a natureza, precisamos também de proteção para nossa cultura e modo de vida.”
Participação massiva e presença ministerial
O evento, que antecede a IV Marcha das Mulheres Indígenas marcada para quinta-feira (7), deve reunir cerca de 5 mil participantes de todos os biomas do país.
A cerimônia de abertura contou com a presença de cinco ministras de Estado:
Sônia Guajajara (Povos Indígenas)
Marina Silva (Meio Ambiente)
Márcia Lopes (Mulheres)
Margareth Menezes (Cultura)
Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania)
Durante os discursos, temas como racismo, machismo, violência contra mulheres indígenas e ameaças ambientais foram destacados.
A ministra Sônia Guajajara alertou para os riscos do Projeto de Lei 2.159/21, que flexibiliza o licenciamento ambiental. Apelidado de “PL da Devastação” por críticos, o projeto aguarda sanção presidencial.
“É dever do Estado garantir políticas públicas de proteção. Ainda enfrentamos ataques diários”, afirmou Guajajara.

Vozes da floresta pedem orçamento, respeito e políticas efetivas
A presidente da Funai, Joênia Wapichana, defendeu que a proteção às mulheres indígenas seja contemplada no planejamento orçamentário do governo federal. “Já estamos enfrentando a violência, agora precisamos de recursos para combatê-la.”
A ministra Marina Silva destacou que, embora o governo tenha retirado invasores de oito terras indígenas nos últimos dois anos, o desafio ainda é “gigantesco”.
“As que menos destruíram são as mais prejudicadas”, disse, em referência às indígenas.
Ela também criticou posturas internacionais e do ex-presidente Jair Bolsonaro, que teve prisão domiciliar decretada na noite anterior, por se opor às demarcações durante seu governo. “Enquanto o planeta caminha rumo ao abismo climático, alguns líderes preferem guerras tarifárias”, provocou Marina, numa crítica indireta ao ex-presidente dos EUA, Donald Trump.
Agrotóxicos e invasões afetam crianças nas aldeias
Presente com os quatro filhos — um deles dormindo no colo — a indígena Soraya Kaingang, de 44 anos, viajou de Londrina (PR) para Brasília. Ela relatou a exposição crescente das crianças aos agrotóxicos espalhados por produtores que invadiram o território onde nasceu, na Aldeia Apucaraninha.
“A gente planta milho, feijão, mandioca… mas está difícil. Contar nossas histórias aqui é também uma forma de resistir.”