Tem torcida gritando, tem disputa acirrada, tem final emocionante. Os e-sports invadiram os Jogos Universitários Brasileiros (JUBs) 2025 — e não é exagero dizer que conquistaram um espaço gigante no país inteiro. Só que, por trás da tela e do controle, existe uma realidade que poucos conhecem: a rotina de um jogador profissional é pesada, a pressão é brutal e o tempo de carreira é curto.
Para quem acha que jogar videogame profissionalmente é só diversão, a agenda de David Luiz Rosa desmonta esse mito de cara. Ele é estudante do terceiro período de Sistemas de Informação na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), campeã de League of Legends no JUBs 2025. Mas Rosa também é atleta profissional de e-sports — e vive uma rotina que mais parece plantão.
“Acordo oito horas da manhã, a partir das 10h já temos uma preparação. Depois vem o intervalo de almoço. Depois de uma da tarde até oito horas da noite é treino. Você joga o jogo, reassiste, conversa sobre possibilidades boas e as ruins”, descreve.
São dez horas de treino por dia. Todo dia. E isso sem contar os jogos oficiais, os compromissos com patrocinadores e a pressão constante para se manter no topo.
O dilema: dinheiro ou diploma?
Rosa sabe que está em um momento decisivo da vida. De um lado, a possibilidade de ganhar até 100 mil reais por mês — salário dos jogadores mais famosos do cenário brasileiro. Do outro, a faculdade, os estágios, a construção de uma carreira “tradicional”.
“Como jogador profissional, às vezes, você pode tirar um ótimo dinheiro, aproveitar ótimas oportunidades. É uma carreira que, querendo ou não, não tem muita longevidade. Os jogadores profissionais acabam perdendo desempenho por volta dos 24 anos. Mas você pode ganhar muito dinheiro. Só que, se eu me arriscar a chegar nesse patamar, eu posso perder um tempo que eu estaria fazendo estágio, estaria me especializando. É aquela balança que pondera para os dois lados. Uma hora você tem que decidir, mas é uma decisão árdua”, pondera David.
E não é só a idade que assusta. É a instabilidade. “A partir do momento que você não está se destacando mais, se acabou o seu contrato, você vai rodar. É um cenário que você tem que estar se reinventando, melhorando, aperfeiçoando, para você ter esse potencial para se destacar, para jogar em times grandes”, explica Rosa.
A cobrança vem de todos os lados: técnicos, patrocinadores, torcida. “O time que eu jogava tinha mais de 3 mil seguidores, e eles cobram”, revela.
O caminho inverso: do profissional ao universitário
Washington Wu, o Washin, é colega de Rosa na UTFPR Azure Bears. Mas ele fez o trajeto oposto. Já foi profissional, recebeu convites para jogar em um dos maiores centros mundiais de e-sports: a Coreia do Sul. E recusou.
A razão? Esgotamento mental.
“Com essa jornada de 16, 17 horas de jogo por dia, ficou bem cansativo mesmo. Não consegui acompanhar muito, fiquei para trás e decidi parar. Vou continuar nesse ramo acadêmico, profissional, buscar trabalho, virar um CLT“, projeta Washin.
Ele largou o sonho de ser estrela dos e-sports para voltar à vida comum — faculdade, estágio, carteira assinada. E não se arrepende.
A pressão psicológica que ninguém vê
Para Sergio Medeiros, coordenador de e-sports da Confederação Brasileira do Desporto Universitário (CBDU), o maior desafio dos e-sports não está na habilidade técnica. Está na saúde mental.
“Os e-sports são muito desgastantes mentalmente. Então existe o desgaste do próprio jogo e existe a falta de preparação mental, de certa forma, para lidar com o ambiente de pressão”, alerta Medeiros.
Ao contrário de esportes tradicionais, onde há uma estrutura de apoio psicológico consolidada, os e-sports ainda engatinham nesse aspecto. Jovens de 18, 19 anos enfrentam pressões de milhares de torcedores, contratos milionários e a certeza de que, em poucos anos, precisarão recomeçar do zero.
E os JUBs, onde entram nisso tudo?
Os Jogos Universitários Brasileiros representam um respiro. Aqui, os atletas jogam pelo título, mas de forma mais leve. O foco é equilibrar estudos e esporte — não transformar o jogo em trabalho.
É nesse ambiente que Rosa e Washin encontraram espaço para competir sem abrir mão da formação acadêmica. É também ali que muitos jovens testam se realmente querem seguir carreira profissional — ou se preferem manter os e-sports como paixão, não como profissão.
O conselho de quem já passou por isso
Washington Wu, que viveu os dois lados da moeda, deixa um recado para quem está pensando em virar pro-player:
“Não se deixem afetar por esse processo de pressão. Aproveitem a vida que sempre vai haver um caminho para o sucesso”.
É simples, direto — e carrega o peso de quem já sentiu na pele o que é escolher entre o sonho e a segurança.
Os e-sports cresceram, viraram indústria, movimentam milhões. Mas, para o jovem que está começando, a pergunta continua: vale a pena apostar tudo nisso? A resposta, cada um descobre do seu jeito. Com sorte, sem arrependimentos.

