O trabalho infantil voltou a crescer no Brasil em 2024, e o aumento mais alarmante ocorreu entre crianças de 5 a 9 anos. Dados divulgados pelo IBGE revelam que 122 mil meninos e meninas dessa faixa etária foram submetidos a atividades laborais, um salto de 22% em relação a 2023. É o maior índice registrado desde o início da série histórica, em 2016.
O avanço preocupa organizações da sociedade civil. Para Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, a situação é “inaceitável”:
“Estamos negando a essas crianças o direito de brincar, aprender e crescer em segurança. Cada criança retirada de sua infância é uma falha coletiva”, disse.
Desigualdade racial e pobreza
Os números também expõem a face estrutural do problema. Embora crianças pretas e pardas representem 66% da população de 5 a 9 anos, elas correspondem a 67,8% das submetidas ao trabalho infantil. Para Mariana Luz, isso revela como pobreza, racismo e invisibilidade social se combinam para ampliar a vulnerabilidade de famílias negras no Brasil.
A advogada e educadora social Patrícia Félix, do Conselho Tutelar do Rio de Janeiro, acrescenta que a situação se agrava em períodos de férias escolares, quando famílias de baixa renda não têm onde deixar os filhos. “Essas mães precisam de escolas integrais e de um ponto de apoio”, afirmou.
O desafio das metas da ONU
O Brasil também se distancia da meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU, que prevê a erradicação do trabalho infantil até 2025. Apesar da redução das chamadas Piores Formas de Trabalho Infantil ─ como atividades em serralherias, matadouros e mineração ─ o país não conseguiu evitar o crescimento no segmento mais jovem da população.
Em 2024, 560 mil crianças e adolescentes de 5 a 17 anos ainda estavam inseridos em trabalhos considerados insalubres ou perigosos. O número representa queda de 39% em relação a 2016, mas permanece elevado.
Políticas públicas e fiscalização
A Fundação Maria Cecilia defende mais investimento em políticas sociais, fiscalização rigorosa e foco nas populações mais vulneráveis. A entidade também destaca a importância do Programa Bolsa Família: entre os beneficiários, a taxa de trabalho infantil foi de 5,2%, contra 4,3% no restante da população ─ diferença que vem diminuindo ao longo dos anos.
O Ministério do Trabalho informou que analisa os microdados divulgados pelo IBGE. Já o Ministério dos Direitos Humanos destacou que atua na prevenção, fiscalização e campanhas de sensibilização, como a #InfânciaSemTrabalho.
Apesar dos avanços, especialistas concordam: sem educação integral, combate à desigualdade e políticas sociais consistentes, o país corre o risco de perpetuar um ciclo de exploração precoce que compromete o futuro de milhões de crianças.

